domingo, 27 de setembro de 2009

CRÔNICA: A PARTEIRA ROSA BARAÚNA

A PARTEIRA ROSA BARAÚNA

Xiquexique, no começo do século XX era extremamente carente de assistência médica. Não dispunha de médicos e muito menos de hospital. As pessoas que mais sofriam com essa deficiente assistência eram as parturientes que ficavam entregues à natureza nos trabalhos de parto, realizados em casa. Para compensar a falta de médicos todos os nascimentos eram acompanhados pelas parteiras também chamadas de “aparadeiras”, sempre representadas por mulheres que aprenderam o ofício observando partos feitos por suas mães. Uma pessoa que, também ajudava muito nessas horas era o farmacêutico local, pois, por menor que fosse a localidade sempre existia uma farmácia.
No que pese a assistência constante das parteiras e eventuais ajudas dos farmacêuticos, era comum casos de falecimentos de crianças ou mesmo de mães por ocasião dos partos face a complexidade do procedimento e até o desconhecimento de remédios que pudessem evitar infecções ou mesmo hemorragias, pois as parteiras ainda adotavam muitos procedimentos empíricos que eram passados de boca a boca sem nenhuma orientação técnica. Muitas vezes dava certo. O cordão umbilical, por exemplo, era seccionado com uma tesoura não esterilizada, simplesmente limpa com um pano embebido em cachaça pois era comum, até, a falta de álcool. A placenta era imediatamente enterrada no quintal da casa e o umbigo da criança, quando caia, deveria ser enterrado na porteira de um curral. E, essa falta de higiene e cuidados com o recém nascido continuava durante os primeiros meses, sendo, pois comum as mortes por diarréia, desnutrição e desidratação, perigo esse que rondava a criança até os 5 anos de idade, muitas vezes sem ter ao menos o registro de nascimento.
A figura das parteiras, instituição milenar e que já existia discretamente em Xiquexique, teve, na década de 1930 um incremento substancial com o surgimento de várias “aparadeiras” que ficaram famosas na comunidade, destacando-se dentre elas Rosa Baraúna, negra baiana, nascida no ano de 1872 e falecida em 1947. Dizem os que a conheceram e principalmente as mulheres que por ela foram atendidas nos trabalhos de parto que Mãe Rosa, como gostava de ser chamada pelas crianças que “aparava”, tinha uma inata generosidade e um espírito de liderança que apenas a sua simples presença transmitia para a parturiente muita paz e confiança durante os procedimentos do parto.
Rosa Baraúna casou-se, em 1898, com Aureliano Raimundo Bahia e continuou vivendo na Ilha do Meio onde, junto com o marido e os 14 filhos, dedicava-se às atividades de pesca e agricultura. Após o falecimento do marido Rosa Baraúna com seus 14 filhos mudou-se definitivamente para Xiquexique, fixou residência na Rua Castro Alves, pois tinha interesse que seus filhos se matriculassem no curso primário que somente existia na sede do município. Os seus 14 filhos foram por ela alfabetizados e a experiência foi tão gratificante que resolveu instalar em sua casa uma escola para alfabetizar outros meninos objetivando a obtenção de renda para ajudar na manutenção da família. Teve tanto sucesso como professora leiga que a sua pequenina escola doméstica chegou a concorrer, na preferência popular, com a escola do já famoso professor Virgilio Bessa.
Naquela época as viúvas eram praticamente obrigadas a manterem luto fechado, para o resto da vida, após o falecimento do marido. Rosa Baraúna não fugiu à regra e apesar de haver enviuvado relativamente nova com apenas 47 anos, usava diariamente uma saia longa preta quase arrastando no chão e uma blusão da mesma cor, protegendo a cabeça com um chale, também preto. A sua indumentária e o seu ar sempre circunspeto talvez motivado pela precoce perda do marido e a grande responsabilidade de criar 14 filhos, davam-lhe um aspecto místico que a caracterizou até a sua morte.
Foi a partir da sua chegada em Xiquexique que Rosa Baraúna começou a exercer a sua atividade de parteira. Talvez tivesse aprendido com os 14 partos que tivera praticamente sem grandes ajudas já que morava numa ilha do Rio São Francisco. Começou atendendo, voluntariamente e apenas com o desejo de ser útil, aos mais pobres, sem nada cobrar pelos seus serviços. Devido à sua grande dedicação e disponibilidade começou a ser chamada pelas mulheres da sua rua de “mão santa” pelo integral sucesso que sempre tinha nos partos por ela assistidos e, as crianças por ela aparadas, por orientação das mães, passaram, respeitosamente, a chamá-la de “Mãe Rosa”.
Rosa Baraúna se destacou das demais parteiras existentes em Xiquexique, naquela época, principalmente pela dedicação que aplicava a cada um dos partos independente da escala social da parturiente. Sempre demonstrando grande zelo pelo seu trabalho, Rosa Baraúna se preocupava com o quarto da parturiente exigindo muita limpeza e usando todos os utensílios devidamente esterilizados com álcool, conforme aprendera com os farmacêuticos locais. Sempre muito paciente, aos que se apresentavam nervosos solicitava que se retirassem e fossem rezar no quarto vizinho. Sempre humilde, não se recusava a pedir o auxilio do farmacêutico de Xiquexique, quando determinado parto se lhe afigurava de difícil solução. Isso fez muita diferença, pois além de não perder nenhuma criança ou colocar a vida da mãe em risco, a cada intervenção do farmacêutico, um profissional mais técnico, mais ela aprendia.
Atualmente Rosa Baraúna é nome de rua, uma gratidão muito justa feita pelo povo de Xiquexique através dos seus representantes políticos. Ainda hoje é grande o número de pessoas que foram “aparadas” pela parteira Rosa Baraúna e que no tempo de menino a trataram como Mãe Rosa. Para esses devem ser grande a alegria e a satisfação ao lerem a placa com o nome daquela que o recebeu quando da entrada neste mundo.
OBS.: A foto é simbólica. Não é de Rosa Baraúna que não temos.
JMC-2007

Um comentário:

  1. Olá li essa historia e meu pai se identificou muito pois no nome de seu pai tem baraúna e sua mãe era francisca,moramos no interior de são paulo a muito tempo,ele ñ conhece ninguem da familia dele q era de valença bahia,veio pra cá muito novo,mais se puderem me dar alguma informação ficarei muito grata,meu e mail é valeria_happymg@hotmail.com.

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