O REFRIGERANTE XIQUEXIQUENSE
Juarez M. Chaves
Lá pelos idos de 1950, até Xique-Xique, pequenina cidade do interior da Bahia com no máximo seus 4.000 habitantes, vivia a euforia do pós-guerra. A exemplo do que acontecia nas demais cidades do Brasil, passou a receber uma enxurrada de bugigangas de plástico empurradas guela abaixo pela industria dos Estados Unidos desejosa de um máximo faturamento para compensar os gastos com a segunda grande guerra.
A cidade se encheu, então, dessas quinquilarias supérfluas e a coisa mais comum de se ver eram meninas requebrando os quadris para manter o bambolê circulando em volta da cintura e os meninos brincando de ioiô, fazendo-o subir e descer amarrado a um barbante preso no dedo médio.
Juarez M. Chaves
Lá pelos idos de 1950, até Xique-Xique, pequenina cidade do interior da Bahia com no máximo seus 4.000 habitantes, vivia a euforia do pós-guerra. A exemplo do que acontecia nas demais cidades do Brasil, passou a receber uma enxurrada de bugigangas de plástico empurradas guela abaixo pela industria dos Estados Unidos desejosa de um máximo faturamento para compensar os gastos com a segunda grande guerra.
A cidade se encheu, então, dessas quinquilarias supérfluas e a coisa mais comum de se ver eram meninas requebrando os quadris para manter o bambolê circulando em volta da cintura e os meninos brincando de ioiô, fazendo-o subir e descer amarrado a um barbante preso no dedo médio.
Xique-Xique, contudo, continuava no mesmo marasmo com sua população economicamente ativa apenas preocupada em comercializar o pescado facilmente obtido, em grande quantidade, no Ipueira, nosso lago de mais de 10 km de extensão que banha a cidade.
Ainda não havia a devida preocupação com a juventude estudantil, pois as "Escolas Reunidas Cézar Zama" era a única escola pública estadual da cidade. O ensino formal somente chegava até o 5º ano primário e, a partir daí quem quisesse continuar os estudos teria que sair da cidade, pois Xique-Xique ainda não dispunha de um curso ginasial.
Foi nesse ambiente que, num certo dia desembarca de um vapor, um senhor alto e bem afeiçoado trazendo consigo uma grande bagagem, totalmente encaixotada e que a primeira vista se apresentava como equipamentos. Tudo indicava que, antecipadamente, já tinha alugado um ponto comercial, pois, de imediato se dirigiu para a Rua Monsenhor Costa e ali, numa casa, depositou todas as caixas.
A partir do dia seguinte à chegada daquele senhor, que viemos mais tarde saber chamar-se de Popesco, foi grande a movimentação principalmente com a entrada de mercadorias e grande trânsito de pessoas encarregadas de fazer a montagem das máquinas trazidas pelo recém chegado. Entre as pessoas da cidade que privaram de uma maior intimidade com Popesco, destacou-se Zeinhô que foi o maior responsável pela instalação e funcionamento do maquinário.
Zeinhô era um auto-didata e detentor de uma inteligência rara que lhe permitia entender todos os mecanismos criados pelo homem e em funcionamento naquela época. Era uma espécie de faz tudo. Entendia de tudo, desde eletricidade a mecânica. Em face desses dotes, Zeinhô teve participação ativa na instalação, funcionamento e manutenção das máquinas trazidas por Popesco.
Mas, talvez com exceção de Zeinhô ninguém sabia para que serviriam tantos equipamentos até o dia em que foi anunciada a inauguração da fábrica de refrigerantes. No dia marcado a fábrica lançou na praça o refrigerante denominado "ATALAIA" que reinou por alguns anos em Xique-Xique e era vendido nos bares da cidade. A composição do xarope que servia para o fabrico do "Atalaia" era do conhecimento exclusivo do Sr. Popesco que a trazia guardada a sete chaves. Sabe-se apenas, quem provou o refrigerante, que não fazia muita diferença do conhecido Q-Suco, mas que naquela época em Xique-Xique, quando até geladeira era novidade, o "Atalaia" fez um grande sucesso e deixou muita saudades quando a fabrica fechou suas portas.
Com o passar dos meses, quando Popesco se revelou um empresário de sucesso e começou a fazer amizade com o povo da terra, soube-se que era um polonês que estava fugindo das tropas de Hitler. Já devia estar no Brasil desde o tempo da invasão da Polônia e se mantido escondido até o final do grande conflito mundial. Mas, mesmo com o fim da guerra, preferiu não se expor nos grandes centros urbanos e por isso deve ter escolhido fixar residência no interior baiano. Sempre que Popesco andava pelas ruas de Xique-Xique costumava assobiar ou cantarolar o bolero “Dez Anos”, que, segundo confiara a alguns amigos, simbolizava os 10 anos que fora forçado pelas circunstâncias a fugir da sua Polônia, apesar de, segundo afirmava, não mais desejar retornar à Europa.
Contumaz mascador de chicletes, dizem até que engolia a goma, foi acometido de um câncer de estômago e viajou para o Rio de Janeiro a procura de tratamento, deixando a fábrica aos cuidados de Zeinhô que a gerenciou até o falecimento de Popesco.
Contavam os amigos mais próximos que Popesco fora avisado por uma cigana que ainda retornaria para a Europa de navio. Costumava contar isso achando graça, numa espécie de deboche, pois não estava nos seus planos sair do Brasil e muito menos de Xique-Xique.
A cigana estava certa, pois como foi sepultado na Polônia, por desejo dos seus familiares que lá residiam, o corpo, mesmo contra a sua vontade foi, de navio, para a Europa.
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