MESTRE CHICO
Demósthenes Silva
Parecia um Deus do Paganismo aquele preto tão simples, tão pobre de estatura física e tão humilde e respeitoso no modo de tratar o próximo.
Parecia um Deus do Paganismo aquele preto tão simples, tão pobre de estatura física e tão humilde e respeitoso no modo de tratar o próximo.
Adquirira, pelo seu mister de desbravar a estrada das letras para o iniciante, o nome Mestre Chico. De mim, não sei a quem eu tratava nesta cidade com mais respeito e veneração do que aquele humilde e respeitável professor que se apresentava e se considerava tão pequeno, mas que, para a minha pessoa, era um gigante na sua obrigação, no seu ideal e no amor à sua causa, era soberbo, gigantesco e nobre, no santo sacerdócio que escolhera e para o qual nascera. Chico nascera Mestre.
Mestre daquela época provinciana em que a palmatória esclarecia as inteligências, abrindo horizontes de alunos que a outros mestres pareceram intransponíveis. Era comum, na cidade, esta frase: "Menino, demônio, eu te ponho na Escola do Mestre Chico". E quase sempre era verdade, porque, logo no outro dia, o menino ameaçado lá aparecia para que o Mestre Chico desse
jeito.
Mas Mestre Chico não era mau, não era perverso. Podia, inicialmente aplicar rigor no aluno peralta, mas logo depois, como que havia uma mútua compreensão entre professor e aluno e tudo corria às mil maravilhas, fazendo com que o progresso surgisse claro e divino no novo aprendiz. Um dia, não sei por que "cargas d'água", me dera o ímpeto de, passando pela rua de Mestre Chico, penetrar na sua escola. Mal chegara à porta, cujo batente superior batia-me pelo pescoço, toda a classe, de uns seis alunos, levantara-se, de súbito, em homenagem à minha pessoa, como se fora um Ministro da educação que houvera chegado. Entrei, obedecendo ao fidalgo convite de Chico e cheguei constatar que, pelo menos um terço dos matriculados não pagavam.
Saí dali pensando em três coisas: no Brasil, no Mestre Chico e no valor que aqui se dá às letras. Então, considerei Mestre Chico um predestinado, um mártir no seu sacerdócio.
E Mestre Chico andava doente. Um dia, esta notícia enchera as ruas da cidade: Mestre Chico morrera. Foi o maior enterro que já se viu nas terras do Xique-Xique. Mas esta homenagem partiu principalmente da gente pobre. E, Mestre Chico tem no nosso meio muito Doutor que fora seu aluno. Falou-se na ocasião em túmulo para Mestre Chico, em ruas com o seu nome, mas tudo isso dependia da Câmara e a Câmara tem coisas mais importantes a cuidar ...
Nota: Esta crônica foi divulgada pelo autor através de "A Voz da Liberdade", serviço municipal de alto-falantes de Xique-Xique (BA), em 1968, ano em que faleceu Mestre Chico.
Mestre daquela época provinciana em que a palmatória esclarecia as inteligências, abrindo horizontes de alunos que a outros mestres pareceram intransponíveis. Era comum, na cidade, esta frase: "Menino, demônio, eu te ponho na Escola do Mestre Chico". E quase sempre era verdade, porque, logo no outro dia, o menino ameaçado lá aparecia para que o Mestre Chico desse
jeito.
Mas Mestre Chico não era mau, não era perverso. Podia, inicialmente aplicar rigor no aluno peralta, mas logo depois, como que havia uma mútua compreensão entre professor e aluno e tudo corria às mil maravilhas, fazendo com que o progresso surgisse claro e divino no novo aprendiz. Um dia, não sei por que "cargas d'água", me dera o ímpeto de, passando pela rua de Mestre Chico, penetrar na sua escola. Mal chegara à porta, cujo batente superior batia-me pelo pescoço, toda a classe, de uns seis alunos, levantara-se, de súbito, em homenagem à minha pessoa, como se fora um Ministro da educação que houvera chegado. Entrei, obedecendo ao fidalgo convite de Chico e cheguei constatar que, pelo menos um terço dos matriculados não pagavam.
Saí dali pensando em três coisas: no Brasil, no Mestre Chico e no valor que aqui se dá às letras. Então, considerei Mestre Chico um predestinado, um mártir no seu sacerdócio.
E Mestre Chico andava doente. Um dia, esta notícia enchera as ruas da cidade: Mestre Chico morrera. Foi o maior enterro que já se viu nas terras do Xique-Xique. Mas esta homenagem partiu principalmente da gente pobre. E, Mestre Chico tem no nosso meio muito Doutor que fora seu aluno. Falou-se na ocasião em túmulo para Mestre Chico, em ruas com o seu nome, mas tudo isso dependia da Câmara e a Câmara tem coisas mais importantes a cuidar ...
Nota: Esta crônica foi divulgada pelo autor através de "A Voz da Liberdade", serviço municipal de alto-falantes de Xique-Xique (BA), em 1968, ano em que faleceu Mestre Chico.
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