quarta-feira, 13 de junho de 2012

Crônica de Demósthenes Silva: "CRÔNICA DA CIDADE"


A primeira festa comemorando o aniversário da cidade de  Xique Xique (BA) foi realizada no dia 13 de junho de1970, quando era Prefeito Municipal o Sr. José Barbosa e Silva. Nessa ocasião foi inaugurado o Hospital Julieta Viana tendo essa festa contado com as presenças dos Governador da Bahia Dr. Luiz Viana Filho e sua mulher Sra. Julieta Viana, muitos prefeitos e vereadores dos Municípios vizinhos e um total apoio do povo xiquexiquense.
Ainda não era  o carnaval popular que se faz hoje, não obstante desde essa primeira homenagem ao aniversário da cidade o festejo já contar com um erro de origem no que tange à data histórica da criação do Município, como se pode ver no brasão da cidade.
O Sr. Demósthenes Silva (1912/1974) grande escritor e orador xiquexiquense que, entre outras atividades exerceu a função de Secretário Municipal do Prefeito João Ferreira Filho (1973/1977), escreveu essa crônica no dia 13.06.1972, terceiro ano da festa da cidade.



                                     Crônica da Cidade
                                                                   Demósthenes Silva

Amigo, hoje é o Dia da Cidade, o dia do aniversário desta cidade de Xique-Xique, ninho hospitaleiro de todos que aqui mourejam, nascidos ou não neste berço, mas comungando do dia-a-dia desta comunidade. Cada um representando o seu papel, no mesmo palco e sob o mesmo cenário ensolarado, salpicado do colorido da nossa mata, que sorri ao céu sereno e azulado. Na apoteose dos crepúsculos, retratados na face da ipueira, a existência de Deus, eis o que sentimos, neste rincão sertanejo, todo luz.
É o dia em que devemos, com as nossas almas ajoelhadas, volver ao Criador do Universo os nossos olhos e dizer: "Pai, eu vos agradeço o teto amigo e carinhoso, murmuroso de águas soluçantes e de mornas brisas em que vivo agora e no qual, talvez um dia, venha a repousar. Eu vos agradeço, Senhor, desta guarida bendita, todo acolhimento, todo calor!"
Por isso tudo, amigo, é que hoje é um dia diferente, que, sendo Dia da Cidade, parece também ser o nosso dia.
Esta crônica é para todos que aqui vivem, mas é, principalmente, para os nossos avoengos, porque sentimos a cidade sendo nossa, e deles muito mais, por conhecerem o seu presente e serem donos do seu passado. Quanto velhinho hoje volve o olhar a uma curva que ficou atrás, na estrada desta vida, buscando ver a si mesmo quando a cidade era mais nova e ele também, quando tinha os seus amores e era amado, quando o mundo era outro e as coisas também ... Naquele tempo, a cidade não fazia aniversário, mas era mais alegre, embora mais parada. É que a alegria era do povo e hoje dizem da Cidade, por ser mais movimentada.
A carestia de vida, os costumes modernos, que ensinaram os moços a chamar os velhos de quadrados, acabaram com as festas alegres e o São João bonito.
Hoje, quem se atreve mais a plantar uma árvore na sua fogueira? Se o fizer, corre o perigo de ser desmoralizado. Capitão de areia é quem manda. Era o tempo
 das vidraças inteiras, do respeito às propriedades públicas ou privadas,
era o tempo em que idade tinha o seu valor e o respeito ensinava que menino é menino e velho é velho. Assim pensa o velhinho e, enxugando com o lenço da saudade uma lágrima do olhar enevoado, recorda as suas serenatas românticas, o seu primeiro amor e, fitando a cidade que se transformou, sente, com o peito amargurado, que, tudo perdeu o seu encanto, desde o romance do namoro à poesia de uma lágrima de mulher. E, buscando na memória cansada o que motivou esta mudança nas pessoas e nas coisas, como que atina com o que falta a todos e balbucia uma palavra: Amor!
13 de Junho de 1972. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário